Thriller policial

Trama Digital – Capítulo 4

Solidão crescente

12 de abril de 2024

Cris, envolto em crescente isolamento em relação aos amigos virtuais, buscava consolo nas consultorias que oferecia. Seu cotidiano começava cedo, quando saía de casa em direção às aulas na faculdade. Ao retornar, trazia consigo notebooks que precisavam de reparo, oferecendo suporte técnico aos seus colegas. Em algumas ocasiões, saía novamente à tarde para entregar os dispositivos já consertados. Caso fossem de colegas da faculdade, os devolveria no dia seguinte.

Teresa, por sua vez, não acompanhava de perto os movimentos de Cris ao longo do dia. À noite, compartilhavam momentos durante o noticiário televisivo. Esses breves instantes eram o principal contato que mantinham.

Ao final daquela semana, mais uma notícia sombria ecoou, anunciando a morte de mais um deputado:


[Voz da TV]:
— Morreu ontem à noite, o deputado Rafael Magalhães. O parlamentar estava em casa e jantava com alguns assessores e apoiadores quando passou mal e foi levado ao hospital. A primeira hipótese é que tenha sofrido um infarto fulminante. Foi constatado que o deputado já chegou sem vida ao dar entrada no hospital.

Teresa desligou a TV, decidindo afastar-se das notícias sombrias que envolviam a segunda morte de um parlamentar em Belo Horizonte. Em busca de conforto, dirigiu-se à cozinha para preparar um lanche reconfortante. O café mineiro foi servido com broa de fubá, destacando-se pelos pedaços generosos de queijo canastra.

Enquanto desfrutavam do lanche, Teresa abordou Cris sobre seus amigos e suas atividades on-line. A resposta dele trouxe a sensação de que a conexão virtual estava se desvanecendo. Em relação à faculdade e à busca por oportunidades de emprego, Cris mantinha uma postura mais descontraída, alegando que ainda era cedo para tais preocupações, mas não era o suficiente para despreocupar Teresa.

— E os amigos, Cris? Não o vejo jogar com eles?

— Estão mais desconectados mesmo.

— Como está a faculdade?

— Normal, mãe, tudo normal.

— Viu alguma oportunidade de emprego na área?

— Ainda é cedo para isso. Preciso de tempo para estudar e tenho conseguido ganhar algum dinheiro com as consultorias. Fique tranquila que em breve pagarei não somente a metade da mensalidade, mas toda a parcela.

— Não é sobre isso, Cris. É sobre você entrar no mercado de trabalho, conhecer pessoas…

— Ainda é cedo, mãe, é cedo.

Os dias se sucediam com uma monotonia previsível, apenas alterando-se os quitutes do café da tarde, como o pão de queijo, a broa de fubá, o biscoito frito, o frango com quiabo, e assim por diante. Teresa, por sua vez, continuava a acompanhar os telejornais em busca de informações sobre a morte do deputado João de Freitas. A falta de novidades sobre o caso deixava-a inquieta, repleta de dúvidas não esclarecidas e um certo ar de mistério pairando no ar.

26 de abril de 2024

Duas semanas depois, as notícias nas emissoras de TV e nos portais da Internet anunciaram a terceira morte de um parlamentar na capital mineira. Dessa vez, o deputado Antônio Dias foi acometido por mal-estar enquanto jantava em um bar na companhia de sua namorada. Apesar dos esforços do socorro imediato e do transporte veloz para o hospital, infelizmente, não houve tempo suficiente para salvá-lo. As informações disponíveis até o momento na reportagem eram escassas, deixando a causa da morte envolta em mistério.

A polícia se deparava agora com três casos de mortes de parlamentares em Belo Horizonte, todos apresentando sintomas de infartos fulminantes. O cenário despertou a atenção da imprensa e das plataformas on-line, gerando uma onda de questionamentos sobre as coincidências intrigantes entre os casos e a ausência de declarações oficiais que esclarecessem os eventos.


[Voz da TV]:
— Poucas informações foram divulgadas sobre a morte dos três parlamentares na capital mineira. Não foram divulgadas as causas da morte dos dois últimos deputados e informações sobre o andamento da primeira investigação também não foram obtidas.

Na imponente sala do Centro de Operações Investigativas do Estado de Minas Gerais (COIMG), um comitê reunido acompanhava com atenção as notícias transmitidas pelas telas do vídeo wall. O ambiente espaçoso abrigava um painel composto por 21 TVs de LED, dispostas de maneira a formar um mural de informações. Diante do vídeo wall, duas fileiras de mesas sustentavam 6 computadores cada, ocupados por operadores e pesquisadores que monitoravam atentamente os desdobramentos dos eventos.

Um pouco mais afastada, em um nível elevado de dois degraus, encontrava-se uma grande mesa de reuniões. Com capacidade para 16 pessoas, ela estava posicionada perpendicularmente ao painel de LED e abrigava os membros do COIMG, além de representantes governamentais. Do lado direito, próximo à entrada da sala, um espaço destinado a buffets estava disponível para servir lanches, cafés ou coffee breaks.

As TVs foram configuradas em diferentes canais de notícias, todas com o som ligado, transmitindo informações sobre as misteriosas mortes dos parlamentares. Os computadores desempenhavam um papel crucial na pesquisa de sites e na obtenção de um panorama abrangente da situação até as 22h. Embora não houvesse novidades sobre os três casos, a investigação naquela noite visava compreender o que a população e a imprensa sabiam sobre o assunto.

À frente do COIMG, o diretor Martim de Carvalho liderava a equipe, recebendo informações de seus colaboradores. Ao redor da grande mesa de reuniões, representantes do Governo de Minas, da Assembleia e das Polícias Militar e Civil do estado acompanhavam atentamente. Bernardo Guimarães, superintendente de Pesquisas, Investigações e Perícias do COIMG, preparava-se para compartilhar os resultados da pesquisa com o grupo.

O diretor Martim de Carvalho, após ouvir as informações prestadas por Bernardo Guimarães, ponderou sobre as revelações que surgiam a respeito das mortes dos parlamentares. A atmosfera séria da sala de reuniões do COIMG refletia a gravidade da situação.

— Apuramos que as notícias divulgadas e o entendimento da população apontam apenas a coincidência de os três políticos mineiros terem passado mal durante o jantar — iniciou Bernardo, compartilhando o resumo das investigações.

Martim de Carvalho, preocupado, indagou sobre as causas das mortes, buscando esclarecimentos mais aprofundados:

— E quanto às causas das mortes, o que está divulgado?

— A primeira, deputado João de Freitas, envenenamento, possível suicídio. A segunda, Rafael Magalhães, possível infarto e a terceira, deputado Antônio Dias, sem causa divulgada.

— E quem divulgou sobre o envenenamento de João de Freitas para a imprensa?

— Não identificamos, senhor.

— E o que nossas investigações internas já descobriram?

Bernardo prosseguiu, apresentando algumas coincidências descobertas:

— Os três parlamentares foram envenenados por Cianeto. Os três, durante o jantar. A comida das panelas da casa do primeiro parlamentar não continha veneno, apenas a de seu prato. A cozinheira não parece conhecer nem a palavra Cianeto e disse não ter usado nenhum ingrediente diferente, nem recebido compras nos últimos dias.

O superintendente de Pesquisas, Investigações e Perícias explicou que, no caso do restaurante e do bar, não havia mais amostras de comida disponíveis para análise, mas nenhum outro cliente que acompanhava Rafael Magalhães apresentou mal-estar. Bernardo Guimarães sugeriu o descarte de investigações adicionais com a cozinheira do primeiro deputado.

Martim de Carvalho, com expressão pensativa, respondeu:

— Pois não pode ser divulgada, de maneira nenhuma, que tratam-se de três possíveis casos de assassinato por envenenamento com Cianeto. Três suicídios é quase impossível de se imaginar. Nosso êxito nas investigações pode ser maior se os assassinos não souberem o que descobrimos.

Virando-se para os representantes do governador e do presidente da Assembleia, ele concluiu seu encaminhamento:

— Vamos designar um detetive exclusivo, especializado em perícias cibernéticas, para acompanhar esse caso. Além disso, abriremos cinco linhas de investigação e forneceremos uma dica falsa como como disfarce:

  1. Investigaremos todas as desavenças e inimigos políticos dos parlamentares.
  2. Solicitaremos exames toxicológicos de todos os assessores e apoiadores que jantavam com Rafael Magalhães e da namorada de Antônio Dias, para sabermos se há algum grau de intoxicação. A manipulação do veneno também deixa rastros.
  3. Pediremos uma autorização judicial para busca e apreensão de substâncias suspeitas na cozinha do restaurante e no bar.
  4. Investigaremos as caixas postais de mensagens de e-mail ou aplicativos dos deputados e descobriremos se receberam ameaças.
  5. Pesquisaremos sobre todas as compras de Cianeto realizadas no país nos últimos cinco anos, buscando possíveis conexões pessoais dos compradores.

E continuou:

— Por último, não confirmaremos, mas deixaremos entender que a polícia encerrará o caso de João de Freitas como suicídio, por falta de outras provas. Assim, os assassinos podem não se preocupar em apagar algum rastro deixado. Mas não quero pronunciamentos formais.

O representante do governador, Domingos Vieira, questionou:

— E quem será o detetive designado para o caso?

— Seu nome não será revelado, Domingos, nem mesmo para minha equipe. Ele reportará somente a mim as informações e eu as passarei à nossa equipe. Informe ao governador que ele pode ficar tranquilo.

O silêncio pesava na sala de reuniões do COIMG quando as discussões foram encerradas. O comitê, composto por peritos, representantes governamentais e o Diretor Martim de Carvalho, deixou o local com uma mistura de tensão e incerteza no ar. Múltiplas linhas de investigação foram traçadas, mas o mistério das mortes dos parlamentares permanecia intacto, gerando apreensão nos presentes.

Martim de Carvalho, líder da operação, refletia sobre as promessas e responsabilidades que recaíam sobre seus ombros. Seu semblante denunciava a preocupação e o peso da situação. Cada passo dado pela equipe de investigação tinha implicações significativas e as respostas pareciam distantes.

Enquanto isso, em um cenário mais doméstico, Teresa jantava sozinha. O aroma de um café fresco e de um pão de queijo quente preenchiam sua cozinha. Por outro lado, Cris se recolhia ao seu quarto, saboreando uma combinação clássica de queijo com goiabada, acompanhada por um copo de café com leite. O cenário contrastava com a tensão do Centro de Operações Investigativas. Cumprindo rigorosamente as três horas permitidas, Cris mergulhava em suas leituras, aguardando o momento propício para uma última partida, ainda que fosse com jogadores anônimos pela Internet. O ritual noturno de Cris estava prestes a se desenrolar, enquanto Martim de Carvalho e sua equipe continuavam a desvendar os enigmas que assombravam Belo Horizonte.

Trama Digital é uma obra com registro de direitos autorais.

Confira o cronograma e os capítulos disponíveis clicando aqui.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *