Trama Digital – Capítulo 6
A rede se estreita
24 de maio de 2024
A equipe de investigação, liderada por Bernardo e Martim, reuniu-se novamente às oito da manhã para compartilhar informações sobre os recentes avanços no caso dos assassinatos. Com um novo padrão emergindo, a tensão aumentou na sala de operações.
Bernardo iniciou os informes, revelando que o quinto assassinato, do empresário Antônio Aleixo, também seguira o método de envenenamento por cianeto. Diferentemente dos parlamentares, Aleixo fora morto com um sanduíche natural em seu escritório, pela manhã. As investigações revelaram que o fornecedor, uma rede de produtos naturais, estava isento de qualquer vestígio de veneno. As câmeras de segurança e o veículo de entrega do estabelecimento não apresentaram indícios suspeitos.
Martim franziu a testa, um pouco surpreso. Ele não acompanhou essa notícia por não ser de um parlamentar. Bernardo terminou sua explicação:
— O quinto assassinato também repetiu mais um padrão: todos ocorreram em uma quinta-feira.
Martim pediu licença para fazer uma ligação telefônica e se afastou. Em pouco tempo retornou e iniciou seus informes:
— Uma atualização da investigação registrou que os quatro parlamentares assassinados tiveram o CPF consultado na Internet. A consulta ocorreu num intervalo de três a cinco dias antes dos crimes. Em seguida, foram feitas consultas nas redes sociais pelo nome das vítimas. Acabei de fazer uma ligação ao nosso detetive para identificar se o mesmo ocorreu para o empresário.
— Consultar as redes sociais pode ser para descobrir os hábitos e informações pessoais. Porém se há uma consulta antes, por CPF, e depois nas redes sociais, podemos trabalhar com a hipótese do assassino não estar sozinho — avalia Bernardo.
— Sim, vamos trabalhar com a hipótese de ser uma quadrilha e estarem trocando informações sobre as vítimas antes do crime. Alguém planeja, outro pesquisa e outro executa. Será nossa linha de investigação.
— Sobre a origem das pesquisas, foi possível alguma pista? O detetive descobriu algo a mais? — pergunta Bernardo.
— Infelizmente não. São usados números de IP’s da Islândia. Entramos em contato com a embaixada da Islândia no Rio de Janeiro e vão nos ajudar. Mas é quase certo que são máscaras falsas de IP e que a origem não é de lá.
“IP“ significa protocolo da Internet. Embora nem todo mundo entenda seu significado, todos nós estamos usando diariamente para que possamos acessar a Internet em qualquer dispositivo. De modo simples, é um número único que é atribuído ao seu equipamento e que o identifica na rede. Seja um computador, um notebook, um celular, um tablet etc. É o número que dá uma identidade virtual a qualquer aparelho conectado. Então, se eu acesso um site, o provedor da Internet sabe o número IP de quem está acessando. Outro parêntesis, bem simplificado: quando eu acesso meu computador e tenho um IP, o leitor acessa o seu celular e tem outro IP. Se eu assumir remotamente o controle do celular do leitor e consultar um site na Internet, o provedor registra que o acesso do site está sendo feito pelo IP do leitor. Voltemos à conversa do Bernardo e Martim.
— Islândia tem uma das Internets mais rápidas do mundo. Está no top 10 de melhores velocidades. Pode ser que seja de lá mesmo — acrescentou Bernardo, considerando a possibilidade.
Martim ponderou por um momento e concordou:
— Sim, é uma hipótese, mas não podemos nos apegar a ela. Continuaremos as investigações e a cooperação com a embaixada, mas mantenham a mente aberta para outras possibilidades.
Com semblante pensativo, Martim olhou para Bernardo e expôs seu planejamento:
— Bernardo, vamos fazer uma mudança em nossos planos. A partir de hoje nós vamos dar acesso ao controle geral de monitoramento do Banco de Dados Nacional a você e sua equipe. Não vão ter acesso somente aos dados estaduais. Quero que vocês monitorem todos os CPFs consultados e ativem a gravação de todas as pesquisas, consultas, conversas e mensagens da Internet no Banco de Dados Nacional.
— Sim, senhor. Faremos isso. Montaremos robôs de Internet para o monitoramento constante. Obrigado pela confiança!
— E quero que ativem alertas para qualquer pesquisa feita na Internet contendo 11 números, porque não sabemos quando a pesquisa é um CPF ou não. Se identificarmos uma possível vítima dessa quadrilha, anteciparemos os passos desses assassinos.
— Se gravarmos todas as operações, toda a Internet vai ficar muito lenta. Nosso Data Center tem capacidade de gravar todas as conversas e operações por aproximadamente 45 dias apenas — alertou Bernardo.
Martim, consciente da limitação, orientou a equipe a expurgar dados com mais de 40 dias que não tivessem relação com as vítimas ou locais de interesse. Para os casos suspeitos, pediu que alterassem o comportamento dos robôs para gravar os passos na Internet por tempo indefinido.
— Sim, vai ficar lenta, mas é uma estratégia. Quarenta e cinco dias é muito pouco. Já estamos quase completando 60 dias do primeiro assassinato. Designe algumas pessoas de sua equipe para expurgar dados de mais de 40 dias que não tenham nenhum tipo de ligação ou possível contato com qualquer vítima ou com suspeitos, embora ainda não tenhamos nenhum. Não exclua informações de quem trabalha ou frequenta a Assembleia Legislativa, os restaurantes e bares envolvidos, a empresa de transporte, enfim, de forma a termos uma grande massa de dados, que envolverá os possíveis suspeitos, por bem mais de 45 dias — concluiu Martim.
Antes de prosseguirmos ao próximo capítulo e aos problemas que estas decisões levaram, caso o leitor não esteja acostumado com o termo robô de Internet, cabe aqui um pequeno esclarecimento.
Não se trata de um boneco ou máquina operando computadores e consultando a Internet. Os robôs de Internet, que podem também ser conhecidos simplesmente como bots ou crawlers, são sistemas informáticos programados para realizar tarefas de forma autônoma, sem um operador online. Seus objetivos são reunir informações e usá-las com diferentes propósitos, que costumam ser úteis e inofensivos para usuários em geral, mas também podem ser usados de forma abusiva por criminosos. Pesquisas mostram que desde 2016, os bots correspondem a mais de 50% do tráfego total da Internet.
A Google, por exemplo, tem um robô chamado Googlebot que possui a função de rastrear, indexar e ranquear sites que estão disponíveis na pesquisa do mecanismo de busca. Ou seja, não existem usuários humanos que precisem cadastrar todos os sites existentes no Google, para que apareçam na pesquisa.
Outro exemplo de bots são os chatbots, que aparecem quando você precisa entrar em contato com uma empresa e a primeira parte do atendimento é conduzida por mensagens automáticas, como se estivesse mesmo conversando com um robô. Em alguns casos, apenas essa ferramenta de comunicação é o suficiente para resolver um problema, solucionar uma dúvida ou receber uma informação relevante. Aqui cabe um parêntesis pessoal deste autor: acredito que boa parte dos chatbots foram programados para fazer você desistir do contato.
Baseado na forma que a maioria das pessoas usa a Internet, é quase impossível que você não tenha interagido com um robô, se beneficiado ou afetado negativamente pela ação de um deles. Eles estão por aí, registrando como você chegou em qualquer endereço da Internet e quanto tempo ficou no site.
Não se engane, eles sabem se você está ou não acessando meu blog e minhas redes sociais.
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