Trama Digital – Capítulo 8

O mistério se aprofunda

07 de junho de 2024

A reunião com a equipe na sexta-feira foi fraca em relação a resultados, porém tensa para os técnicos, à medida em que o tempo estava se passando, o mistério se aprofundando e não havendo avanços nas investigações.

Bernardo recebeu logo cedo as informações do exame do IML confirmando o envenenamento e compartilhou com a equipe:

— Pessoal, infelizmente tivemos a confirmação que a morte do Sr. Fernandes Tourinho foi também por envenenamento por cianeto. Ele estava em um restaurante de comida chinesa quando passou mal e o restante, nós sabemos como foi.

Bernardo então colocou na tela as preocupações a serem trabalhadas:

1. Era preciso identificar por que não perceberam a consulta prévia ao CPF da vítima e corrigir a falha no monitoramento.
2. O custo político da operação montada, gerando lentidão na Internet pelo pouco poder de processamento, era muito alto.
3. A temerosidade do programa ser interrompido, caso houvesse outra falha.

— E se, de repente, não houve falha? E se o assassino mudou o padrão de comportamento após o vazamento no canal da Alessandra?  — perguntou um dos técnicos.

— É o ponto que precisamos esclarecer. Por favor, analisem ao máximo se há mudança no comportamento ou se falhamos no monitoramento.

08 de junho de 2024

Às oito e meia, Martim entra no parque. Usava uma bermuda, tênis de caminhada e camiseta esportiva. Bernardo o aguardava observando as carpas. Cumprimentaram-se normalmente como se o encontro ocorresse por acaso e saíram a caminhar, conversando sobre futebol. Na parte de cima da Praça das Águas, próximo ao Teatro de Arena, iniciaram uma das trilhas de caminhada do parque.

— Bernardo, preciso te apresentar uma pessoa que está trabalhando conosco — iniciou Martim.

— Sim, e quem é?

— É o detetive que está no caso e me dá algumas informações complementares. Seu nome é David. Ninguém sabe que ele trabalha para o governo. Com isso, ele pode andar em qualquer lugar da cidade investigando e observando, se necessário, além de não se tornar alvo de um hacker no mundo virtual.

— Aqui no parque?

— Sim, ele estará na terceira ilha de mesas de piquenique. Finja que já o conhece e não diga o nome dele em voz alta.

— Ele sabe que eu o conhecerei hoje?

— Sim, ele pediu essa reunião aqui no parque. Hoje é dia sem artefatos tecnológicos, com mais segurança.

E continuaram fazendo a trilha. Depois de uns minutos chegaram à mesa, onde David estava sentado.

Os dois chegam em silêncio e se sentam na mesma mesa, como se já estivessem juntos, um chegando primeiro e os outros dois em seguida em uma caminhada.

— Que bom que aceitou vir ao encontro, precisava falar com você — iniciou David.

— Nem sabia que era opcional — brincou Bernardo, para quebrar um pouco a tensão.

— Descobrimos que houve uma mudança no comportamento do assassino, que não está mais fazendo consultas do CPF como anteriormente.

— Então, não falhamos?

— De certa forma, falharam. Porém agora as pesquisas do criminoso são feitas por robôs desenvolvidos em Python, não mais em sites da Internet, mas em várias bases de dados de empresas comerciais. Continuam usando máscaras não identificáveis. São disparadas mais de mil requisições ao mesmo tempo. Como são requisições em banco de dados, algumas retornam o nome e dados pessoais. Depois disso, ele faz nova pesquisa pelo nome da pessoa, da forma anterior. Mas essa é difícil porque pesquisas com nomes são feitas o tempo todo. Os computadores do COIMG estão monitorando as pesquisas por CPF somente e não detectam a segunda busca.

— Vamos alterar nosso programa de pesquisa para monitorar e gravar também as requisições diretas a bancos de dados, além de pesquisas de sites apenas.

— Teremos uma Internet mais lenta? — pergunta um preocupado Martim.

Bernardo explicou:

— O aumento da lentidão será pequeno porque a rede já está lenta, não vão perceber tanta mudança. Mas preciso de uns cinco dias para implementar isso.

— Outra coisa importante — continua David — e o motivo de eu pedir a reunião aqui no parque. Existem outros hackers que estão usando os assistentes virtuais Siri, Google ou Alexa para ouvir a conversa de um ou mais membros da equipe, e vazando informações para a imprensa.

— Então é desta forma que obtiveram as informações dos envenenamentos e consulta dos CPFs? — questionou Bernardo.

— Acredito que sim. Esses assistentes virtuais estão instalados praticamente em todos os aparelhos e podem peneirar dados de seus usuários para a publicidade digital, capturando conversas mesmo quando não estão usando o celular. De alguma forma, conseguiram hackear uma dessas bases dos fornecedores. Você precisa pedir à sua equipe para entrar na sala de pesquisas sem o celular, mas informe isso à eles fora da rede e longe de qualquer smartphone, para que os hackers não saibam que identificamos isso.

Bernardo pergunta se o assunto é confirmado ou se é somente uma suspeita:

— Você tem certeza desse problema com os assistentes?

— Sim, eu fiz o seguinte teste com o Martim: após o vazamento das pesquisas do CPF nós conversamos propositalmente sobre pesquisas de “hábitos religiosos”, com os celulares no bolso, sem uso. Essa informação foi acrescentada no segundo post do canal da Alessandra.

— Tudo vai se tornando cada vez mais difícil: o celular é uma importante ferramenta de trabalho — lamenta Bernardo.

— Isso aí, vamos continuar — disse Martim saindo em caminhada.

Bernardo entendeu que era para segui-lo e saiu sem se despedir. David caminhou em outra direção, numa bifurcação da trilha.

Os dias seguiram intensos no trabalho das pesquisas. Refizeram o projeto de monitoramento com a equipe de desenvolvimento, trabalhando quase conjuntamente com a equipe de projeto. Mesmo não sendo indicado, foi necessário devido ao pouco tempo disponível. Concluíram todas as implementações somente na quinta-feira, dia 13 de junho, já na hora do almoço.

Então, o primeiro passo foi realizar a consulta para todos os dias da última semana, para saber se alguma nova pesquisa tinha sido feita naqueles dias.

Bernardo ficou chocado com o resultado. Saiu apressadamente da sala, pegou seu celular e ligou imediatamente para Martim. O clima tenso refletia-se na voz de Bernardo ao falar com Martim:

— Martim, precisamos nos encontrar o mais rápido possível. A situação está mais complicada do que imaginávamos. Eu descobri algo crucial. Podemos nos encontrar ainda hoje?

Martim, do outro lado da linha, percebendo a urgência na voz de Bernardo, respondeu:

— Claro, Bernardo. Estou na minha sala. Onde podemos nos encontrar?

Bernardo, mesmo com a voz firme, não escondeu a preocupação:

— Por favor, deixe o seu celular na sala e vá até a garagem, meu carro é o verde, na terceira fileira do estacionamento.

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